domingo, 7 de agosto de 2016

Sobre meninos e panelas - Parte II


Sobre meninos e panelas–Parte II

... E ao chegarmos na penúltima rua do bairro simples da  P1em Juruti, ainda  a uma certa distância do ponto de distribuição da sopa fraterna, que fica no final da rua, já ouvimos o anúncio de um garoto:
- O carro da sooopaaaa!!!!!
Já acho graça, pois o anúncio tem um misto de alegria e aviso aos demais que estão jogando bola num terreno desocupado ou estão dentro das casas simples de madeira.
Um grupo de meninos e suas panelas já estão a postos no ponto de distribuição. Quando descemos, a fila, rapidamente, já está formada na traseira do “carro da sopa”. Mas não estão todos ainda!
Antes de iniciarmos a distribuição, pergunto:
- Quem gosta de sopa?
-Eeeeeeu! Grita o coro das crianças que estão na fila. E a recomendação se repete:
- Mas tem que comer todas as verduras, certo?
Um pequenino de uns 3 ou 4 anos pergunta ansioso:
- A sopa é de que?
- De galinha.
E ele faz uma carinha de que gosta de sopa de galinha.
A distribuição segue com Brandão e Aparecida dispondo a sopa nas panelas.
- Quantos são na sua casa?
- Nove.
- E na sua?
Um menorzinho pára, pensa um pouco olhando pra cima e responde:
- Dez.
Outro:
- Sete.
Enquanto isso, uns meninos descem a rua levando a sopa, dobram à esquerda, em direção a última rua da P1, no limite da área de preservação ambiental do Jará. Logo surgem outros meninos e meninas vindos do mesmo lugar, correndo, subindo a rua em que estamos, de panelas na mão. Foram avisados pelos que já haviam recebido a tão esperada sopa. A solidariedade é comum entre os que sabem seu valor!
Em seguida, a distribuição tem uma pausa, enquanto esperamos os retardatários. Enquanto isso, converso com dois irmãos que já receberam sopa e estão no portão de sua casa.
- Como é teu nome? Pergunto ao maior e ele responde:
- Marcos.
Meio acanhado, meio desconfiado. Talvez por que não seja comum receber atenção dos adultos. Pergunto então ao menor:
- E o teu?
-Mateus. Responde rápido como um raio.
- Hum, vocês tem nome de santo! Eles sorriem olhando pro chão.
O maior tenta mostrar habilidade com um tico-tico e cai. O menor ri bastante.
- Vocês tem mais irmãos? Como é o nome deles?
Marcos fala mais três nomes que não consigo grava-los.  Pergunto ainda pela idade dos dois e descubro que tem 7 e 4 anos. Enquanto a tarefa finaliza, fico pensando no tamanho daquelas crianças, provavelmente abaixo do peso, que alguns pais, na vida simples e sofrida da pobreza, escolhem para seus nomes o dos apóstolos do cristo na esperança que tenham um futuro conforme prometido por Jesus.
Então, novamente me vem à lembrança aquela belíssima história contada a mim pelo confrade Arimatéia, de Santarém, na qual um Espírito sublime, e por isso mesmo anônimo, orienta por um emissário, um grupo de certo Centro Espírita que estava na iminência de cancelar o trabalho da sopa (por dificuldades na arrecadação dos mantimentos),  a  superar as dificuldades e manter a tarefa. E o Espírito revela docemente por que: Para muitas daquelas pessoas que recebiam a sopa, aquele prato era a refeição mais completa e importante da semana.
A noite cai. E, de coração firme no propósito, seguimos para a última parada na Rua da Saudade: a casa de Kelly...

Por Jaime Albuquerque

Juruti, 06 de agosto de 2016

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