Sobre
meninos e panelas–Parte II
... E ao chegarmos
na penúltima rua do bairro simples da P1em
Juruti, ainda a uma certa distância do
ponto de distribuição da sopa fraterna, que fica no final da rua, já ouvimos o
anúncio de um garoto:
- O carro da
sooopaaaa!!!!!
Já acho
graça, pois o anúncio tem um misto de alegria e aviso aos demais que estão jogando
bola num terreno desocupado ou estão dentro das casas simples de madeira.
Um grupo de
meninos e suas panelas já estão a postos no ponto de distribuição. Quando
descemos, a fila, rapidamente, já está formada na traseira do “carro da sopa”. Mas
não estão todos ainda!
Antes de iniciarmos
a distribuição, pergunto:
- Quem gosta
de sopa?
-Eeeeeeu! Grita
o coro das crianças que estão na fila. E a recomendação se repete:
- Mas tem
que comer todas as verduras, certo?
Um pequenino
de uns 3 ou 4 anos pergunta ansioso:
- A sopa é de
que?
- De
galinha.
E ele faz
uma carinha de que gosta de sopa de galinha.
A
distribuição segue com Brandão e Aparecida dispondo a sopa nas panelas.
- Quantos
são na sua casa?
- Nove.
- E na sua?
Um
menorzinho pára, pensa um pouco olhando pra cima e responde:
- Dez.
Outro:
- Sete.
Enquanto
isso, uns meninos descem a rua levando a sopa, dobram à esquerda, em direção a
última rua da P1, no limite da área de preservação ambiental do Jará. Logo
surgem outros meninos e meninas vindos do mesmo lugar, correndo, subindo a rua
em que estamos, de panelas na mão. Foram avisados pelos que já haviam recebido
a tão esperada sopa. A solidariedade é comum entre os que sabem seu
valor!
Em seguida,
a distribuição tem uma pausa, enquanto esperamos os retardatários. Enquanto
isso, converso com dois irmãos que já receberam sopa e estão no portão de sua casa.
- Como é teu
nome? Pergunto ao maior e ele responde:
- Marcos.
Meio
acanhado, meio desconfiado. Talvez por que não seja comum receber atenção dos
adultos. Pergunto então ao menor:
- E o teu?
-Mateus.
Responde rápido como um raio.
- Hum, vocês
tem nome de santo! Eles sorriem olhando pro chão.
O maior
tenta mostrar habilidade com um tico-tico e cai. O menor ri bastante.
- Vocês tem
mais irmãos? Como é o nome deles?
Marcos fala mais
três nomes que não consigo grava-los.
Pergunto ainda pela idade dos dois e descubro que tem 7 e 4 anos.
Enquanto a tarefa finaliza, fico pensando no tamanho daquelas crianças, provavelmente
abaixo do peso, que alguns pais, na vida simples e sofrida da pobreza, escolhem
para seus nomes o dos apóstolos do cristo na esperança que tenham um futuro conforme
prometido por Jesus.
Então, novamente
me vem à lembrança aquela belíssima história contada a mim pelo confrade
Arimatéia, de Santarém, na qual um Espírito sublime, e por isso mesmo anônimo, orienta
por um emissário, um grupo de certo Centro Espírita que estava na iminência de
cancelar o trabalho da sopa (por dificuldades na arrecadação dos mantimentos), a superar as dificuldades e manter a tarefa. E o
Espírito revela docemente por que: Para muitas daquelas pessoas que recebiam a
sopa, aquele prato era a refeição mais completa e importante da semana.
A noite cai.
E, de coração firme no propósito, seguimos para a última parada na Rua da Saudade:
a casa de Kelly...
Por
Jaime Albuquerque
Juruti,
06 de agosto de 2016
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